sábado, 25 de junho de 2011

CAP VII- HISTORIAS DA MARIA CÉLIA

Minhas bolinhas amarelas!

Sábado! Como eu gosto do sábado! Hoje voltaríamos à praia, iríamos almoçar olhando o mar. era hora de levantar. Preguiçosamente levantei e fui tomar uma ducha e escovar os dentes. Nooossa! As bolinhas da Nair estavam todinhas na minha barriga, mas eram diferentes, tinham pontinhos amarelos. Resolvi então telefonar para meu filho doutor, e pedir uma orientação. Parece que era uma epidemia grave, podia ser catapora, varicela ou quem sabe varíola!
-“Alô” atendeu do outro lado, meu filho.
-”Fernando, sou eu, bom dia! Estou igual o vestido da Minie, só que minhas bolinhas são amarelas, a Nair não tinha bolinhas amarelas....’
Iniciamos um diálogo absurdo, quanto mais ele perguntava mais eu afirmava: -“ Acho que é varíola! Mas pode ser varicela. Estou cheia de bolotas, não, de bolinhas, todas amarelinhas, um horror!
Finalmente ele falou, com aquele tom final, que todo médico fala quando não admite mais nenhuma fala do paciente e a consulta está encerrada.
- “Mãe, isto é stress”. Fica calminha. Vai passear no mar, Varíola é uma doença extinta, não vai ser você que vai trazê-la de volta. Vai passear, esquece os problemas que amanhã, ou mais tarde até depois de amanhã as bolinhas já foram embora. Sabe aquela pomada que você estava usando? Passa ela outra vez.
Te amo de cá, te amo de lá, desliguei o telefone meio decepcionada. Puxa ninguém acredita nas minhas bolinhas. Mas que é varíola, isto eu sei que é! À noite ao deitar olhei com carinho para minhas bolinhas, e pensei: como são bonitinhas, nem coçam. Nesta noite tive febre alta.
Meu primeiro domingo em João Pessoa.
Fomos passear conhecer a praia do jacaré. À tardinha, ao voltar para casa, comecei a sentir arrepios de frio novamente, e muita febre. Naquela noite conversei com Deus, que não e levasse antes de eu me reencontrar com meus filhotes e com o Abrão, queria vê-los mais uma vez. Como é bom a gente ter uma família.

terça-feira, 21 de junho de 2011

Cap.IV - HISTÓRIAS DE MARIA CÉLIA .

A CHEGADA DO CARRO



Terça-feira acordei cedo, o céu estava nublado, parece que iria chover muito, mas acho que daria para a gente ir à praia só para ver o mar, a chuva deve vir lá pelo início da tarde e, apesar de tudo, o calor e o mormaço convidava a um passeio à beira mar. Estava terminando de colocar o biquíni quando caiu uma tempestade. Bom, é hora de trocar de planos, vamos ver e-mails. Neste momento meu telefone tocou era meu filhote Zeca informando que a cegonha que ia trazer meu carro para João Pessoa havia chegado e que era para eu entrar em contato com a empresa para ir buscá-lo.

Meu Deus, eu já sabia que esta transportadora ficava na saída de João Pessoa, e eu não sou lá essas coisas de boa motorista em dia normal, imagine chovendo e sem conhecer o caminho... Além disto, o carro tinha virado o “meu caminhão de mudanças” e trazia malas e malas, pacotes e mais pacotes dentro, sem falar nas roupas de cama, mesa e banho. Lá também tinha panelas, aparelhos de massagens, CDs e livros aos montes e muitas, mas muitas fotos. Afinal eu ia organizar meus álbuns... Pensei em ir de taxi, levar a Neves e voltar atrás do taxi com a Neves e as malas que tampavam minha visão. Deus do céu, será que não tinha nada mais fácil, não? Ideia! Finalmente falei com o gerente da transportadora e pedi que entregassem meu carro no apartamento. Combinamos por R$ 80,00, bem mais em conta do que se fosse de taxi.

Pir volta das duas horas da tarde o carro chegou, lindo, em cima de uma carreta. Chique demais! Finalmente eu retornava a vida dos andantes. 

Fiquei pensando se pedia para o motorista da empresa colocar ou não o carro na garagem, na minha vaga estreitinha como todas as que a gente conhece. Fiquei horririzada com a situação que me encontrava, se colocasse o carro na garagem nunca mais ia dar conta de tirar ele de lá. Se não colocasse tinha que ficar de fora, e ele estava cheinho de mudança...   Bom, finalmente eu resolvi ficar sem carro e pedi para que fosse guardado na garagem.

Finalmente enchi de coragem e fui subir a mudança. Logo, logo percebi que meu carro tinha que continuar sendo um guarda roupa. Levei malas, algumas roupas de cama, banho, panelas e meus papeis, CDs e fotos. As minhas fotos...

Aquela tarde foi só de arrumação. À noitinha tempo bom, a chuva foi embora, saímos às três velinhas para passear na praia, Nair estava toda feliz na cadeira de rodas, afinal ela tinha duas motoristas para carrega-la e os joelhinhos não iriam mais quebrar.

Camarão, cervejinha gelada, queijo coalho e lá ficamos a relembrar outros fatos. Engraçado como guardamos momentos preciosos de nossas vidas escondidos bem dentro da gente, e é só um toque que as coisas venham  tropeçando uma atrás da outra, nos fazendo rir, chorar e até mesmo sonhar. Foi assim aquela noite. 

Só os velhos sonham e escondem seus sonhos para não serem rotulados de chatos ou ridículos, eles querem atenção, respeito e amor, amor incondicional com aceitação de seus defeitos, sem serem cargas pesadas para ninguém.
 Para não serem rejeitados ficam calados, quietos nos cantos, quase que invisíveis, esquecem-se de sorrir e contam os dias para ir embora. Dão o que têm e o que podem e não pedem nada em troca, talvez porque estão cansados de escutarem que dão muito, muito trabalho.
Quando fui dormir, agradeci a Deus pela oportunidade desta experiência e pedi coragem para enfrentar o medo da garagem!


terça-feira, 7 de junho de 2011

Cap III PRIMEIRO DIA EM JOÃO PESSOA




Acordei com o barulho dos carros, motos e ônibus passando na rua. Puxa vida! Como os automotores fazem barulho!
 Fazia anos que não escutava, na cama, o burburinho da rua agitada. Minha casa em Brasília mais parece uma fazenda, aliás, tem tudo de fazenda, pensei. 

Olhei para a Nair, que dormia na cama ao lado. Estava que nem um anjo! Levantei degavarzinho, como falava o Bruno, e fui para a sala, queria rever João Pessoa!
De um lado o mar batia suas ondas docemente na praia, como que a convidar a um convívio amoroso, do outro lado prédios enormes, verdadeiros arranha-céus enfeitavam a paisagem, trazendo-me um aperto enorme no coração. O que tinha acontecido com aquele pedacinho de paraíso?

Ah¹ Já sei, descobriram João Pessoa! Que pena! Logo, logo, o bicho homem iria acabar com a melhor qualidade de vida do país. Olhei saudosa procurando as casas beira mar. Já nao existiam mais. Tudo era um comércio só. Isso não podia me incomodar, o que eu queria era o sol e o mar e eles estavam lá, me esperando...

Como ia sair dali levando a Nair, sem cadeira de rodas? Já pensou fazer todo o trajeto de volta na ida e na volta novamente? Não ia dar! Tinha que fazer supermercado... Porque Deus não fez a gente sem estômago? Já pensou como seria mais fácil? Deve ter sido porque não havia tanta tecnologia como agora, tenho certeza de que se fosse hoje tudo iria ser muito mais klin. 

Bom, tenho que providenciar uma cadeira de rodas também! O que vou comprar primeiro?
Estava nesta importante tomada de decisão quando a Neves abriu a porta e fez um –“Bom dia", que mais parecia um grunhido e foi  logo disparando:- “Que horror, esta barulheira não dá para ninguém dormir!”. Enquanto falava abria as sacolas da padaria retirando pãezinhos quentinhos com manteiga, e dois copos de café. “–Fui à padaria e trouxe café para vocês, sabem quantas horas são? 11:35! Todo mundo já acordou, só vocês estāo dormindo.
-" È mesmo? Que delícia de café, só mesmo você Net”, falei.
-“Mas esta não é uma cidade turística, conhecida pela sua tranquilidade?” Vamos sair?
- Vamos sim vou acordar a chefe.

Quando entrei no quarto a madrinha tinha sumido. Só podia estar no banheiro, então devagarinho abri a porta e quase morri de rir. A privada do apartamento ficava num elevado de uns 20 cm, parecia um trono, e lá estava ela sentada, literalmente no trono com os pezinhos no ar e encurvada para frente, segurando a bancada da pia do banheiro. Os olhos estavam arregalados e o medo de cair estava estampado no seu rosto.

-“Quem será que fez isto?” Perguntou.
Eu comecei a rir e falei que ia tirar uma foto para mandar para o Zeca.
-”Não, não, o Zeca não, ele vai colocar no Orkut! Tira-me daqui”, pedia suplicante!
- Parece que uma inquilina deste apartamento tinha uma prótese nos quadris e não podia dobrar a perna", explicou a Neves, "pelo menos foi isto que o parteiro me contou"!
- “Nossa, você mal chegou e já sabe das histórias até de outros inquilinos.”
- “A rádio corredor funciona aqui no nordeste também”, comadre.
A
Fiquei pensando se prótese de quadris impede mexer o joelho? Agora estava danado, até ensinar a madrinha a fazer xixi de pé, igual  homem, ia ser uma guerra! Se ela aprendesse e gostasse eu ia aprender também, e quando fosse visitar os parentes da capital eu ia ter uma novidade: Não tinha mais inveja dos homens, nós as velinhas terroristas fazíamos xixi de pé. kakakakak

Relembrei a noite anterior. Que absurdo! Acho que nem o melhor escritor de ficção ia imaginar uma cena como a de ontem, no aeroporto. Falta bom senso nas administrações dos serviços públicos brasileiros, falta treinamento, e o Manual que foi escrito e que serve para nortear os procedimentos tem regras únicas para todos. Incrível como um simples fato trouxe um alvoroço tão grande, e sempre quem perde é o senhor cidadão consumidor. Meus pêsames!

Começamos a arrumar nossas coisas com grande cuidado, e a todo o momento comentávamos a ordem e organização da Marietinha, a dona do apartamento. Tão pequenina, tão linda e caprichosa, sem falar na competência administrativa que tem.

Tínhamos que comprar uma cadeira de rodas. Este era o nosso grande problema. Peguei uma lista telefônica e comecei a ligar. Ninguém mandava entregar, e os preços variavam de R$ 200,00 até a R$1.400,00 e olha que nenhuma era motorizada.

 Acho que a Nair motorizada não ia dar certo, a gente ia levar cada susto! Finalmente descobri que várias lojas ficavam na mesmas rua. Legal, parecia Brasília, e aí era só pegar um taxi e ir lá comprar uma cadeira. Fomos almoçar e trouxemos uma quentinha para a Madrinha que a esta altura dizia que estava enjaulada no apartamento. 

Deixamo-la sentadinha no sofá e partimos para a grande aventura da escolha de uma cadeira de rodas. Você sabe escolher uma cadeira de rodas? Eu não, a Neves muito menos, mas a gente sabia que queria um rodante que levasse a Nair para passear na areia da praia. Ia ser muito difícil carregar ela até o mar. Ai eu sonhava com a cadeira motorizada que vi no Resort de Valencia. O garoto que a pilotava nem mexia com a mão e andava na praia toda. A madrinha não queria andar com os pés, será que ela ia achar bom pilotar com as mãos uma cadeira na praia?

 Escolhe aqui, escolhe ali, entra numa loja e depois em outra, e mais outra e assim fomos descendo a rua toda, umas seis quadras e acabamos descobrindo que a primeira cadeira que vimos era a melhor e a mais em conta. Volta aqui, entra ali, puxa, como tem gente comprando cadeira de rodas. Será que todo mundo está com o mesmo problema da gente? 

Bom, finalmente compramos a cadeira, um andador de quatro pontas e uma almofada plástica de Gel. Que bom, a nossa chefe merece o melhor. O tempo tinha voado, as lojas estavam começando a fechar e a noite já estava caindo, tínhamos que pegar outro taxi. Neste momento lembrei de ver as horas e procurei meu celular. Cadê meu celular?

 –”Neves você guardou meu celular, você viu meu celular”? 
Enquanto isto as portas das lojas iam fechando e eu fiquei desesperada. Tinha que encontrar meu celular. Voltei na loja da compra, na outra, na da frente à depois desta já estava fechada e parece que todas as lojas haviam combinado fechar e eu só ouvia os clicks das portas de ferro baixando. 

Lembrei de telefonar para o meu telefone, quem sabe ele ia me responder, afinal já estava tão acostumado a ser esquecido! Um alô distraído me trouxe de volta a esperança de reaver meu celular. Será que iam pedir resgate?
Depois de inúmeras explicações peguei um taxi e fui para o fim da rua, onde uma gentil senhorita paraibana estava me aguardando com meu telefone querido na mão. Agradecimentos daqui e dali, retornamos ao taxi, eram cinco horas da tarde e já estava escuro, o transito parecia o do centro de São Paulo. Filas intermináveis, todo mundo quase parando. Ai o motorista me deu a explicação mais incrível do mundo. 

Só tem duas ruas que ligam o centro de João Pessoa às praias e uma delas, a Beira Rio, fecha quando chove porque a agua empoça num final de ladeira, e nenhum carro pode passar, e a noite passada tinha chovido muito e a rua ficara fechada. Parece que este tem sido o grande problema das administrações, atual e passadas.

 Porque ninguém resolvia este problema? Fiquei imaginando, pelo que eu conheço de administração pública ou o problema era muito grande, e precisava de muito dinheiro para arrumar e este não devia ser o caso, porque se assim fosse a obra já teria sido contratada em regime de calamidade pública, urgência urgentíssima, ou era muito pequeno, de poucos gastos e aí nunca seria olhada como de relevância e, portanto, não valia a pena contratar uma empreiteira...

Chegamos à casa cheinhas de presentes para a nossa velinha, chefe do bando. Um sorriso grande estampou em seu rosto quando viu os equipamentos que a ajudariam a sair da clausura
-" Enfim estou livre da gaiola!” riu ela com a felicidade de uma criança que ganha o seu primeiro velocípede.

Ainda não fui à praia e nem tomei agua de coco, mas comi balinha de goma. Amanhã vamos fazer as compras de Supermercado e à tarde iriamos todas, de rodinhas e tudo o mais, para a praia.
Nesta noite, ao deitar, agradeci a Deus por mais estas lições: a do cuidado com nossas coisas, a da honestidade, a importância da ética e probidade administrativa, mas antes de fechar os olhos vi a minha mãe sorrindo, me agradecendo pelos cuidados com a Nair. 
Meu Deus, como a gente esquece de ver as precisões dos velhos. Como eles se escondem no silêncio para não nos incomodar, deixando de lado até mesmo suas necessidades mais prementes! Senhor ensina-me a ser uma velha que não incomode ninguém. Hoje estou começando a entender melhor as necessidades que tem, os que amo.